Para a maior glória de Deus: a pedra fundamental da educação brasileira.

Crédito: Portal Jesuítas Brasil.

É pacífico na historiografia que a educação brasileira só se tornou “universitária”, tal como concebemos, nos anos 30; em outras palavras, as primeiras experiências de ensino superior no Brasil só ocorreriam 308 anos depois da chegada dos colonizadores, pois a criação de cursos superiores no País aconteceu somente com a vinda da família real portuguesa para o Brasil, em 1808 (MOROSINI, 2005).

Por outro lado, é diferente do que ocorreu em alguns países da América espanhola, que tiveram suas universidades quando ainda eram colônias, como o Peru, ou independentes, como o Chile. Em 1553, o México já tinha uma universidade. Isso se deve porquanto, para a Coroa hispânica, a ideia de universidade estava associada ao império, sua manutenção e expansão; para a monarquia portuguesa, não, porque era pragmática. Desde a Idade Média, a universidade angariou o posto de vital para os governantes, das quais saíam os quadros da magistratura civil e eclesiástica.

Segundo Morosini (2005), essa realidade, no Brasil, manteve-se por mais de um século, de 1808 a 1934, sendo as instituições educacionais fortemente influenciadas pelo modelo napoleônico, prevalecendo a desvinculação entre teoria e a prática, estudo e pesquisa, que, na Constituição de 88, tornar-se-iam uma tríade indissociável nos departamentos universitários. Os principais cursos eram voltados ao ensino médico, de engenharia, de direito, de agricultura e de artes.

Regressando, a educação tupiniquim teve seu início propriamente dito com o fim do período das Capitanias Hereditárias, que perdurou entre 1532 e 1549, e findou quando D. João III criou o Governo Geral (MOROSINI, 2005).

Em estudo sobre a Administração Geral no Brasil, Dias (2016) relata que no primeiro governo, sob a batuta de Tomé de Sousa, aportaram em Terra Brasilis o Padre Manuel da Nóbrega¹, o qual se tornou o primeiro Provincial com a fundação da província jesuítica brasileira em 1553, permanecendo no cargo entre 1549-1559, sendo substituído posteriormente por Luís de Grã (1559-69), que também veio ao Brasil em 1553, na terceira leva de jesuítas, e dois outros jesuítas, os primeiros professores do País. O padre Manuel da Nóbrega, que ficou conhecido como o grande defensor dos índios², nas décadas à frente da Companhia no Brasil, teve papel ativo no processo de colonização e catequização dos colonos. Colaborou ativamente na fundação da aldeia de Piratininga (1553), que se tornou posteriormente a cidade de São Paulo, no Colégio de São Paulo (1554) e na cidade do Rio de Janeiro (1565). Entretanto, a maior contribuição ocorreu na área educacional, pois sob seu comando foram fundadas cinco escolas elementares em Porto Seguro, Ilhéus, Espírito Santo, São Vicente e São Paulo de Piratininga, e três colégios no Rio de Janeiro, Pernambuco e Bahia.

Nesse período, a educação se distingue em studia inferiora, que correspondia ao ensino médio, e o studia superiora, que compreendia o estudo da Filosofia e da Teologia, prefiguração de ensino superior em relação ao que se praticava na Europa. O Curso de Filosofia tinha três anos de duração e ensinava Lógica, Ética, Geometria e Cosmografia. O de Teologia, em quatro anos, incluía o estudo das Escrituras Sagradas, Hebraico e Teologia especulativa e prática, conforme a pedagogia da Ratio Studiorum³; adaptada à situação colonial, a Ratio estruturava-se em quatro graus o ensino sucessivo e propedêutico: Elementar, Humanidades, Artes e Teologia. Como bem informou o padre Serafim Leite, existiram 17 colégios, sendo que o primeiro foi fundado na Bahia, sede do Governo Geral. Em 1553, iniciaram-se os cursos de Humanidades e, em 1572, os cursos de Artes e Teologia, provavelmente, os primeiros “cursos superiores” do País (CUNHA, 1988).

Cunha (1988) relata que em face do não reconhecimento como universitários dos cursos de Filosofia e de Teologia ministrados nos colégios jesuítas, argumentou-se que Portugal não queria universidade para que não houvesse o desenvolvimento da alta cultura na Colônia, com base em seus desígnios extrativistas. A Coroa preferia que seletos mancebos fossem estudar em Coimbra com a concessão de bolsas.

Em outra ótica, embora o intuito metropolitano de monopolizar o ensino superior fosse assim tão forte, não teriam criado, contudo, tantos cursos de Filosofia e Teologia nos colégios dos jesuítas, chegando a existir até mesmo um curso de Matemática; não teriam reformados os cursos de Filosofia e Teologia dos franciscanos, no Rio de Janeiro, e o de Filosofia no Seminário de Olinda, ambos em fins do século XVIII, inseridos, justamente, num movimento de reforço dos laços coloniais (CUNHA, 1988).

Na discussão por que a Espanha criou tantas universidades na América e Portugal, nenhuma, Cunha (1988) vai mais além. Referenciando Júlio Cezar de Faria, apontou que a Espanha encontrou povos mais cultos, facilitando a disseminação do conhecimento. Não só por isso, mas também pela concepção de Estado tida pela Coroa espanhola. Para tanto, os missionários tiveram a função de conhecer os costumes dos nativos e de pregarem em suas línguas. Os jesuítas procuraram fazer com o ensino da língua geral, em todo o litoral brasileiro. Outra diferença foi quanto aos recursos educacionais. Enquanto a Espanha contava com oito universidades no século XVI, Portugal dispunha apenas da Universidade de Coimbra, vindo depois a de Évora, criação do cardeal-rei Dom Henrique.

Todavia, o referido autor chega a questionar se a educação superior brasileira àquela época, em relação aos seus vizinhos, não seria tão somente nominal, haja vista a qualidade e currículos dos cursos ofertados pelas instituições da Companhia de Jesus no Brasil. Ele observa, ainda, que todas as pompas e solenidades universitárias de formação das universidades católicas europeias eram vistas na formatura dos egressos das instituições jesuíticas.

Saliente-se que a educação teve três fases nesse período: a do predomínio dos jesuítas; a das reformas pombalinas, principalmente a partir de 1759 com a expulsão dos jesuítas do Brasil e de Portugal; e o período em que D. João VI, então rei de Portugal, desembarcou no Brasil (1808-1821) com todo o estamento burocrático de então (CUNHA, 1988).

A fim de realizar a colonização das terras brasileiras, a Coroa portuguesa contou com a colaboração imprescindível da Companhia de Jesus. De acordo com que prelecionam diversos autores, a principal intenção do rei D. João III ao enviar os jesuítas para a Colônia brasileira foi para converter o índio à fé católica, objetivando “civiliza-lo”, por intermédio da catequese e do ensino de ler e escrever o Português (LEITE, 1965; AZEVEDO, 1976; RAYMUNDO, 1998). Então, a educação brasileira estava nas mãos dos jesuítas que estiveram no Brasil desde o século XVI. E isso não foi ruim.

Ferreira JR e Bittar (2008) afirmam que no Brasil e em Portugal, no período colonial, consoante uma lógica mercantil, entretanto, os jesuítas alteraram aqueles seus objetivos educacionais que os trouxeram ao Brasil. Nesse contexto, os índios foram deixados de lado pela missão educacional da Companhia de Jesus, que os substituíram pelos filhos dos grandes proprietários agrários. A pedagogia jesuítica, na prática, destarte, resumiu-se a formar alguns privilegiados da altas castas sociais que, através do domínio do saber, orientavam as atividades mais complexas e operavam como centro difusor de conhecimentos, crenças e valores, isto é, a manutenção do status quo.

Nesse sentido, os jesuítas acabaram instaurando aquilo que seria a principal marca de nossa educação ao longo da história: o exclusivismo, naturalmente, a despeito de isso hoje não fazer mais sentido. Esse direcionamento não foi suficiente para que a Companhia de Jesus inaugurasse o ensino superior no Brasil, pois de acordo com Sguissardi (2008, p. 215), a “ideia de universidade no Brasil” foi-lhes negada. Ou seja, “parecia, mas não era”.

Para Azevedo (1976), a atuação da Companhia de Jesus na Colônia brasileira pode ser dividia em duas fases: na primeira fase, considerando-se o primeiro século de atuação dos padres jesuítas, foi a de adaptação e construção de seu trabalho de catequese e conversão do índio aos costumes dos colonizadores; a segunda fase, o segundo século de atuação dos jesuítas, foi de grande desenvolvimento e extensão do sistema educacional implantado no primeiro período.

As causas da expulsão dos jesuítas do Brasil, promovida pelas reformas do Marquês de Pombal, podem ser pensadas, segundo Azevedo (1976) por dois prismas: a) político e ideológico, pois a Companhia de Jesus tornara-se um empecilho aos interesses do Estado Moderno português, bem como porque detentora de grande poder econômico, cobiçado pela Coroa portuguesa; e b) educacional, em relação às transformações sociais advindas do movimento Iluminista e dos princípios liberais que requeriam a formação de um novo homem, o homem burguês, o comerciante, e não mais o homem cristão medieval.

Assim, Teixeira Soares (1961) está correto quando afirma que os jesuítas pretendiam formar o modelo de homem cristão, diferentemente do homem burguês que estava sendo formado na Europa. Por isso, a expulsão da Companhia de Jesus deve ser compreendida enquanto um processo mais amplo, e que envolve questões de cunho político, ideológico e econômico. Não foi algo particular da Portugal pombalina; esse movimento antijesuítico ocorreu na Espanha também.

O fato é que, não à toa, para diversos autores (LEITE, 1965; TEIXEIRA SOARES, 1961; ALMEIDA, 2000; RIBEIRO, 1998; AZEVEDO, 1976)⁴, os padres jesuítas podem ser considerados os primeiros e únicos educadores do Brasil colonial, sem os quais não é possível compreender a dinâmica histórica do período.

Por suposto, os jesuítas possuíam um projeto educacional, que, apesar de estar subordinado ao Projeto português para o Brasil, tinha determinada autonomia e teve papel fundamental, contribuindo para que o governo lusitano atingisse seus objetivos no processo de colonização e povoamento do País.

Por fim, vale lembrar que as instituições confessionais cristãs de educação superior – e mesmo Básica -, especialmente as católicas, ainda ostentam o título de melhores entre as IES privadas. A maioria, para não dizer todas, não tem fins lucrativos. As Pontifícias Universidades Católicas é encontrada em várias partes do mundo. A Igreja mantém no Brasil desde escolas até universidades de renome internacionais. Aliás, o Papa Francisco I é um jesuíta.

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  1. O padre Manuel da Nóbrega e seus companheiros da Companhia de Jesus fundaram, na Bahia, em 1549, a primeira “escola de ler e escrever” brasileira. O plano de estudos organizado pelo padre Manuel da Nóbrega consistia em duas fases: na primeira fase, considerada como do ensinamento dos estudos elementares, era constituída pelo aprendizado de português, do ensinamento da doutrina cristã e da alfabetização. Para a segunda fase do processo de aprendizagem idealizado por Manuel da Nóbrega, o aluno teria a opção para escolher entre o ensino profissionalizante e o ensino médio, segundo suas aptidões e dotes intelectuais revelados durante o ensino elementar. Como prêmio para os alunos que de destacassem nos estudos da gramática latina, previa-se o envio em viagem de estudos aos grandes colégios de Coimbra ou da Espanha (SHIGUNOV NETO, MACIEL, 2008. p. 176).
  2. A liberdade dos indígenas sempre foi defendida pelos padres da Companhia de Jesus, apesar de não se oporem formalmente à escravatura, em virtude sua situação frente à Coroa portuguesa.
  3. O Ratio Studiorum foi publicado originariamente em 1599 pelo padre Geraldo Cláudio Aquaviva e visava à formação do homem cristão, de acordo com a fé e a cultura cristã, e era um manual prático e sistematizado que apresentava ao professor a metodologia de ensino a ser utilizada em suas aulas. Foi influenciado pela orientação filosófica das teorias de Aristóteles e de São Tomás de Aquino, pelo Movimento da Renascença, e, por extensão, pela cultura europeia da época (SHIGUNOV NETO, MACIEL, 2008).
  4. “Educadores, por vocação, mestres notáveis a todos os respeitos, eles puderam exercer na colônia, favorecidos por circunstâncias excepcionais, um verdadeiro monopólio do ensino, a que não faltava, para caracterizá-lo, o apoio oficial que lhes deu o governo da Metrópole, amparando-os, na sua missão civilizadora e pacífica, com largas doações de terras e aplicações de rendimentos reais dotação de seus colégios.” (AZEVEDO, 1976, p. 36-37)

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